A Outra que Mora no Amor de Lula

Recentemente, o presidente Lula soltou uma de suas frases que, como ele mesmo, não passa despercebida: “As amantes são mais amadas que as esposas.” Foi o suficiente para acender um debate nacional. Hordas de defensores da moral e dos bons costumes partiram para o ataque, enquanto outros apenas riram e seguiram com suas vidas. Mas será que ele estava tão errado assim?

Lula não estava falando sobre traição ou desvalorizando o casamento. Quem conhece o presidente sabe que ele não é dado a falar por falar. Como bom observador da vida brasileira, talvez estivesse apenas apontando para uma verdade sobre o amor: amamos mais a ideia de alguém do que a pessoa real.

Rubem Alves já dizia que o amor não se dirige ao outro em sua totalidade, mas à “Outra” que nele habita – a projeção idealizada, feita de sonhos, desejos e fantasias. E aqui está o ponto central. As amantes, por ocuparem um lugar fora do cotidiano, longe das brigas pelo controle remoto ou das contas atrasadas, tornam-se o território perfeito para essa idealização. Elas são, muitas vezes, as metáforas vivas do que falta em nossas vidas, como Milan Kundera explica em A Insustentável Leveza do Ser.

A esposa, por outro lado, é a realidade. Ela não vive apenas no terreno da imaginação; ela existe no dia a dia, no mundo das pequenas falhas humanas. É a mulher que divide as frustrações, que enfrenta as imperfeições do amor satisfeito, como dizia T.S. Eliot. A amante é distante, inacessível, quase mágica. A esposa é próxima, concreta – e justamente por isso, menos poética.

Mas antes que algum leitor se levante indignado e grite “Machismo!”, é preciso dizer que o raciocínio funciona para ambos os lados. A mesma dinâmica vale para maridos e amantes. Afinal, como Fernando Pessoa escreveu: “Amamos sempre no que temos o que não temos quando amamos.”

O presidente, na sua fala, não desmereceu o amor conjugal. Ele apenas colocou o dedo na ferida de uma verdade incômoda: o amor humano é, muitas vezes, insatisfeito. Buscamos no outro o que falta em nós, e é mais fácil encontrar isso em alguém que não esteja preso às dificuldades do cotidiano.

Defender essa frase de Lula não é romantizar a figura da amante ou desprezar o casamento. Pelo contrário, é reconhecer que o amor, para ser verdadeiro, precisa transcender a idealização. Amar a esposa – ou o marido – é um ato muito mais difícil e poderoso do que amar a amante. Porque é na realidade, e não na fantasia, que o amor realmente se prova.

No fim das contas, o que Lula talvez quisesse dizer é que o amor não é uma questão de comparação, mas de compreensão. Se há algo a aprender com essa polêmica, é que o amor exige que enxerguemos a “Outra” no rosto de quem está ao nosso lado todos os dias. E isso, meus amigos, é mais revolucionário do que qualquer amante poderia ser.

João Guató

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