As Raízes que a Escola Não Ensina

Naquela tarde abafada, a sala de aula parecia uma panela de pressão. Ventiladores giravam preguiçosos no teto, mas o calor de Rondônia vencia fácil. Professor Jão, conhecido por seu jeito descontraído, entrou na sala com o sorriso de sempre. As alunas Eliane, Andréia, Josielle e Jennifer, todas morenas e atentas, ocupavam a primeira fila, prontas para mais uma conversa que prometia sair do convencional.

— Meninas, hoje vamos falar de educação ambiental — anunciou Jão, jogando um giz para o alto e pegando de volta, como se estivesse lançando um desafio.

Eliane: (já antecipando) Coleta seletiva, professor?

Andréia: Ou desmatamento?

Josielle: Plantar árvore, né? Sempre falam isso.

Jão deu uma risada curta.

— Nada disso. Hoje a gente vai falar de um tipo diferente de educação ambiental. Um que não tá nos livros didáticos, mas tá nas histórias, nas práticas e nos saberes das pessoas que vivem ao nosso redor. Alguém aqui já ouviu falar de educação ambiental etnográfica?

As quatro se entreolharam, franzindo a testa. Nenhuma resposta.

Jennifer: (hesitante) Tem a ver com… gente?

Professor Jão: Exatamente, Jennifer! Educação ambiental etnográfica é sobre as pessoas e suas relações com o lugar onde vivem. É sobre como cada comunidade entende e cuida do meio ambiente com base em suas experiências.

Eliane: Tipo… a minha avó, que sempre sabe quando vai chover só de olhar pro céu?

Professor Jão: (apontando para Eliane) Perfeito! Esse é um exemplo clássico. A sua avó tem um conhecimento que não foi aprendido na escola, mas no dia a dia, vivendo naquele território.

Josielle: (curiosa) Então, não é só sobre proteger a natureza?

Professor Jão: Não só isso. É sobre entender como as pessoas vivem com a natureza. Luci Sauvé, uma pesquisadora que estuda isso, diz que a educação ambiental pode ser uma espécie de cartografia. Não um mapa comum, mas um mapa dos saberes e das experiências das pessoas.

Andréia: (pensativa) Mas, professor, por que a gente não aprende isso na escola?

Professor Jão: (suspirando) Porque, muitas vezes, a escola ensina a olhar só pro conhecimento científico, como se ele fosse o único que importa. E esquece que o conhecimento das comunidades, das pessoas simples, também tem valor.

Jennifer: (olhando pela janela) Então, o Seu Zeca, que mora lá perto do rio, tem esse tipo de saber? Ele sempre diz que os peixes somem quando a água fica barrenta.

Professor Jão: Isso mesmo, Jennifer! O Seu Zeca sabe coisas sobre o rio que nenhum livro de Biologia ensina. Isso é educação ambiental etnográfica: aprender com quem vive e entende o ambiente de um jeito que a gente nem sempre percebe.

Eliane: (entusiasmada) Então, a gente deveria prestar mais atenção nas histórias das pessoas daqui, né?

Professor Jão: (sorrindo) Exato, Eliane! Cada história, cada saber é uma peça desse mapa invisível que nos ensina a cuidar do mundo de forma mais profunda e respeitosa.

O sinal tocou, mas ninguém levantou. As meninas estavam imersas naquele novo jeito de pensar. Antes de sair, Jão deixou um último recado.

— Meninas, quando vocês forem pra casa hoje, conversem com alguém mais velho, alguém que conhece bem o lugar onde vocês vivem. Perguntem sobre o que eles sabem da natureza. Vocês vão se surpreender com o mapa que eles carregam na cabeça.

E assim, enquanto o calor lá fora continuava implacável, na sala de aula o professor Jão tinha plantado outra coisa: a ideia de que a educação ambiental não está só nos livros, mas nas raízes que cada um de nós carrega sem saber.

O sinal tocou novamente, agora insistente. As meninas começaram a recolher o material, mas a conversa ainda fervilhava na cabeça de cada uma. Antes de saírem, Josielle fez uma última pergunta:

Josielle: Professor, tem algum exemplo daqui, de Ji-Paraná? Um que mostre bem isso que o senhor falou?

Professor Jão sorriu, como quem já esperava aquela pergunta.

— Tem sim. Já ouviram falar da dona Marieta, lá na beira do rio Machado?

Jennifer: A que faz aquelas ervas pra remédio?

— Essa mesma — confirmou Jão. — Ela não só conhece as plantas da região, mas também entende o ciclo do rio. Sabe quando ele vai encher ou baixar, conhece as melhores épocas pra pescar e até que tipo de peixe é bom pra cada doença.

Andréia: E isso é educação ambiental etnográfica?

— É sim, Andréia. Dona Marieta aprendeu isso com os pais dela, que aprenderam com os avós. É um conhecimento que vem de viver naquele lugar, ouvindo, observando, respeitando. Não tá nos livros, mas tá na vida.

Eliane: Então, o rio Machado também tem suas histórias?

— Tem muitas, Eliane — disse Jão, com o olhar perdido por um instante, como se estivesse vendo o rio. — E cada uma delas é um pedaço do mapa que a gente precisa aprender a ler.

As meninas saíram da sala em silêncio, mas com o olhar curioso de quem agora enxergava o mundo de um jeito novo. Professor Jão ficou ali, arrumando os papéis, satisfeito. Sabia que naquele dia não tinha só ensinado uma aula, mas plantado uma semente. E, como o rio Machado que sempre corre, a educação também segue seu curso, fluindo pelos caminhos da cultura, da memória e do respeito às raízes.

Eliane: (entusiasmada) Então, a gente deveria prestar mais atenção nas histórias das pessoas daqui, né?

Professor Jão: (sorrindo) Exato, Eliane! Cada história, cada saber é uma peça desse mapa invisível que nos ensina a cuidar do mundo de forma mais profunda e respeitosa.

O sinal tocou, mas ninguém levantou. As meninas estavam imersas naquele novo jeito de pensar. Antes de sair, Jão deixou um último recado.

— Meninas, quando vocês forem pra casa hoje, conversem com alguém mais velho, alguém que conhece bem o lugar onde vocês vivem. Perguntem sobre o que eles sabem da natureza. Vocês vão se surpreender com o mapa que eles carregam na cabeça.

E assim, enquanto o calor lá fora continuava implacável, na sala de aula o professor Jão tinha plantado outra coisa: a ideia de que a educação ambiental não está só nos livros, mas nas raízes que cada um de nós carrega sem saber.

O sinal tocou novamente, agora insistente. As meninas começaram a recolher o material, mas a conversa ainda fervilhava na cabeça de cada uma. Antes de saírem, Josielle fez uma última pergunta:

Josielle: Professor, tem algum exemplo daqui, de Ji-Paraná? Um que mostre bem isso que o senhor falou?

Professor Jão sorriu, como quem já esperava aquela pergunta.

— Tem sim. Já ouviram falar da dona Marieta, lá na beira do rio Machado?

Jennifer: A que faz aquelas ervas pra remédio?

— Essa mesma — confirmou Jão. — Ela não só conhece as plantas da região, mas também entende o ciclo do rio. Sabe quando ele vai encher ou baixar, conhece as melhores épocas pra pescar e até que tipo de peixe é bom pra cada doença.

Andréia: E isso é educação ambiental etnográfica?

— É sim, Andréia. Dona Marieta aprendeu isso com os pais dela, que aprenderam com os avós. É um conhecimento que vem de viver naquele lugar, ouvindo, observando, respeitando. Não tá nos livros, mas tá na vida.

Eliane: Então, o rio Machado também tem suas histórias?

— Tem muitas, Eliane — disse Jão, com o olhar perdido por um instante, como se estivesse vendo o rio. — E cada uma delas é um pedaço do mapa que a gente precisa aprender a ler.

As meninas saíram da sala em silêncio, mas com o olhar curioso de quem agora enxergava o mundo de um jeito novo. Professor Jão ficou ali, arrumando os papéis, satisfeito. Sabia que naquele dia não tinha só ensinado uma aula, mas plantado uma semente. E, como o rio Machado que sempre corre, a educação também segue seu curso, fluindo pelos caminhos da cultura, da memória e do respeito às raízes.

João Guató

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