O Horoscopista

Por Marinaldo Custódio

De astrologia e horóscopo, certo é que todo mundo sabe um pouco. Um pouco para nós, os leitores, os que olham por olhar, porque existe gente falando que disso sabe muito.

Entendem. E falam. E cantam.

E cantam, tanto, até na música popular. Que o diga Odair José, entre brega e romântico, num lance de oferenda: “diga em que dia, em que mês você nasceu / pra ver se o teu signo combina com o meu / e o meu coração será seu” (Horóscopo). Já Jorge Mautner e Moraes Moreira cantaram à maneira deles, entre sérios e brincalhões, para ‘acasalar’ os nativos de todo signo. No trecho que a nós interessa, filosofaram: “você, olhos de fuligem / vê se acalma a alma na obsessão / só vai se dar bem com alguém / com alguém de Virgem / e muita atenção com essa mordida / do Escorpião” (Namoro astral).

Na imprensa escrita, desde sempre, o assunto tem lá o seu cantinho reservado. E sagrado. Por isso, quando fico curioso para saber o que me reservam os astros quanto a amor e destino e dinheiro, pego o jornal e vejo o que tem pra hoje. E o que tem por hoje é o horóscopo dizendo aos escorpianos e às escorpianas que, neste mundo, o negócio é mesmo amar. Logo, aconselha: “seja mais generoso com quem você ama e o retorno virá em forma de amor”. E, em complemento, nos passa um pito: que, contrariando nossa opinião, teimosia, obsessão, orgulho e amor-próprio, melhor é desistir de querer fazer só aquilo que a gente deseja e que essa coisa de querer impor aos demais nossas vontades nunca há de nos resultar nenhum proveito.

Não sei, não sei. Mas entre as poucas certezas que posso ter nesses assuntos astrais, muito provavelmente o horoscopista, aquele que horoscopiza todo dia, não deve ter nascido sob o signo de Escorpião. Outra: ele também, por certo, não leu – e se leu não interiorizou – aquela máxima de botequim segundo a qual o ser humano a tudo renuncia nesta vida menos ao seu desejo.

Entra um personagem, está rolando o Bulixo de toda quinta-feira no Sesc Arsenal, e vai logo justificando os integrantes do seu círculo: “a história dele, a história dela em parte bate com a minha. Que todo cartunista seja perdoado”. Pois, pois. Que toda escorpiana, todo escorpiano seja, pois, automaticamente perdoado de todo exagero e implicâncias, da famosa mania de posse e toda a obsessão que já cometeu ou vier a cometer na vida.

Afora isso, pouco ou nada sei. Sei apenas que ontem choveu muito em Cuiabá. Choveu um rio de Piracicaba, inteirinho, na vazante. E hoje amanheceu nublado, chuviscou, mas o tempo continua quente. Agora, cá estamos na escola e dizem que é preciso escrever. Mas escrever o quê?

Não sei, não sei. Por enquanto, só sei que chove em minha alma e a internet está lenta.

MARINALDO CUSTÓDIO é escritor. (Este texto é uma versão estendida da crônica ‘Escorpião’, do livro “Vestida de preto & outras crônicas”, publicado pela Entrelinhas em 2018)

João Guató

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