O Lobo Solitário
Francisco Wanderley Luiz, o Tiu França, era um homem de silêncios e explosões. Candidato a vereador derrotado no interior de Santa Catarina, chaveiro de profissão, e, segundo seus vizinhos, alguém de comportamento reservado, mas com ideias inflamadas. Na noite de quarta-feira, transformou-se no epicentro de um atentado que abalou o coração político do país: a Praça dos Três Poderes, em Brasília.
Era por volta das 19h30 quando as primeiras explosões sacudiram o espaço, interrompendo o ritmo noturno da capital. No chão, junto aos paralelepípedos que sustentam os pilares da democracia, estava Francisco, que usara um explosivo preso à nuca para pôr fim à própria vida. A poucos metros, seu carro, um antigo Kia Shuma, ardia em chamas, transformado em um depósito de explosivos caseiros.
A Polícia Federal, com a destreza de quem já montou quebra-cabeças semelhantes, agora tenta entender quem era esse homem que, a princípio, parece ter agido sozinho. Seria ele realmente um “lobo solitário”, movido por delírios pessoais, ou o rosto visível de uma engrenagem invisível e maior?
A Trilha de Francisco
Francisco chegou a Brasília em 27 de julho. Instalou-se em uma kitnet em Ceilândia e alugou um trailer próximo ao Congresso. Segundo os investigadores, ali, na quietude de seus esconderijos, ele planejou o atentado. Mas sinais de que talvez não estivesse tão só começam a emergir: mensagens criptográficas em seu espelho, referência a Débora Rodrigues — uma das responsáveis por atos golpistas em janeiro —, e explosivos espalhados tanto no imóvel quanto no trailer.
No espelho, um detalhe peculiar: a inscrição “Por favor, não desperdice batom. Isso é para deixar as mulheres bonitas. Estátua de merda se usa TNT.” Parece o recado de quem zomba tanto da estátua da Justiça quanto do que ela representa.
Os equipamentos encontrados indicam que Francisco, ainda que improvisado, não era amador. Para a fabricação dos explosivos, ele utilizou materiais como extintores de incêndio, capazes de funcionar como lança-chamas. Suas intenções, segundo a ex-mulher, incluíam nada menos que o assassinato do ministro Alexandre de Moraes, ícone da resistência contra os atos de janeiro.
Lobo ou Rebanho?
O diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, hesita em classificar Francisco como “lobo solitário”. A suspeita é que ele tenha sido motivado por ideais extremistas e possivelmente financiado ou incentivado por um grupo. Câmeras de segurança e os celulares encontrados com o chaveiro podem fornecer respostas sobre eventuais cúmplices.
Na história recente do Brasil, atos extremistas ganharam o palco central, alimentados por discursos de ódio e polarização. Francisco, com seu boné estampado com o lema bolsonarista “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”, carrega em si a sombra de um radicalismo que se nutre de desesperança e crenças distorcidas.
Um Eco na Esplanada
A Esplanada dos Ministérios, bloqueada após o atentado, ficou em silêncio. Sob os holofotes, os pilares do Supremo Tribunal Federal permaneciam intactos. Era ali que Francisco tentou lançar seus explosivos. Era ali que seu gesto encontrou o limite físico da democracia.
O Brasil acorda com perguntas sem respostas. Quem era Francisco Wanderley Luiz além do “lobo solitário”? Era mesmo um lobo? Ou apenas uma peça de um jogo maior, movido a delírios coletivos?
Por enquanto, resta a cena: a praça lavada, as marcas da explosão apagadas, mas o impacto ainda reverberando na memória de um país que tenta, a cada novo golpe, se manter de pé.