O Natal no Pantanal
O Natal no Pantanal não é como nos livros, nem como o de quem mora na cidade. Aqui, o Natal se abre nas margens do rio, onde o céu é mais largo e a terra é mais silenciosa. O que se vê é diferente. O Natal no Pantanal é um suspiro que nasce na brisa e morre na beira do alagado. O milagre é simples: ele acontece no encontro do capim com a água, no brilho da estrela que salta de madrugada e na dança das aves que se despem de pressa.
Eu penso que o Natal, por aqui, é feito de formas invisíveis, como as raízes do buriti que se escondem na lama, ou o canto manso do curió que aparece, mas só na hora certa. Não adianta procurar, o Natal no Pantanal não se diz, ele se sente. Ele é o sorriso do rio quando o sol bate na água e faz tudo brilhar. E é o canto do sabiá, lá na árvore torta, que parece nos chamar, como quem lembra que o tempo é um pingo, e que a gente deve aproveitar o instante.
O Pantanal, no Natal, não tem pressa de mudar. As águas continuam a subir devagar, como se estivessem esperando uma festa que não é de ninguém. A luz que cai do céu não precisa de lâmpada, nem de enfeite. É a luz de um sol que se derrete na paisagem e se espalha pelos campos, como uma poeira dourada. O Natal aqui não é de presentes, mas de presença. De estar ali, com o olho atento ao movimento das coisas, com o ouvido atento ao murmúrio da água, que sempre traz um segredo.
Eu vejo o Natal no Pantanal nas árvores que se esticam em silêncio, na ave que voa sem pressa de chegar. O Natal é a leveza da capivara, que se aproxima da margem com sua calçada de patas grandes e o olhar tranquilo. O Natal aqui é mais perto da terra que das estrelas, mais no cheiro da água do que na luz das lâmpadas. O milagre é o mesmo, só que mais lento, mais acolhedor, como um abraço de quem não se apressa em abraçar.
E quando a noite vem, o céu do Pantanal se enche de estrelas, e parece que elas se acendem sem querer. A estrela d’alva aparece, mas ela é tímida, se esconde atrás da silhueta de um tuiuiú que, de vez em quando, passa voando baixo, sem fazer barulho. Não tem ceia, não tem fogo de artifício, mas tem a lua refletida na água, como um espelho que nos lembra que a vida, às vezes, é feita de quietude. E é nessa quietude que o Natal se faz.
Aqui, o Natal é um tipo de recomeço. Recomeço de seca, recomeço de chuva, recomeço de estrela. O Natal no Pantanal não precisa de explicação. Ele é o momento que nasce com o canto do arara, com o som do rio que vai levando a poeira e trazendo mais vida. E é isso o Natal: um movimento que nos envolve sem pressa, que nos toca e nos ensina a ouvir o que não é dito, mas é sempre ouvido.
E assim, o Natal no Pantanal é uma coisa sem pressa, que vai se revelando aos poucos, como o movimento da garça que, de cabeça baixa, vai deixando que o silêncio se faça. Não há o que apressar. O Natal aqui é como o perfume da terra molhada, que vem e vai, e que permanece nos olhos de quem sabe olhar. E, enquanto o sabiá canta lá nas margens e o rio se embriaga de brilho, sabemos que o Natal chegou. Não porque alguém tenha dito, mas porque ele foi anunciado na calma do Pantanal.